5 dias. 12 CEOS. 6 nacionalidades. 7 aprendizados. 1 objetivo: aprendermos mais sobre nós mesmos e conectarmos com founders de países diferentes, porém com desafios semelhantes para evoluirmos como pessoas e líderes.
Será que em um mundo cheio de diferentes culturas, os problemas, dores e questões são os mesmos? O que nos une e nos separa na jornada empreendedora? Eu estava ansiosa para descobrir as respostas para tantas perguntas.
E o que vi, conto neste relato para você.
A convite dos incríveis André Barrence e Fernanda Caloi, participei junto com os outros CEOs do Global Alumni Summit, programa que aconteceu em Novembro de 2018 no Google for Startups de Tel Aviv, em Israel.
E lá fui eu, entender um pouco mais do ecossistema empreendedor incrivelmente surreal deles, já que Israel tem a maior concentração de startups do mundo. Para você ter uma ideia do cenário de conglomerados:
Qual o segredo? Por que existe uma cultura de startup tão forte no país? O que faz com que sejam tão inovadores, globais e tenham produtos fora da curva?
Nada mais, nada menos que uma cultura que gosta de conflito e uma comunidade forte.
Explico: Quando o conflito existe, podemos entender o quanto o evitamos e o quanto nos estressamos emocionalmente ou não.
Cada país tem um modo, um jeito de tratá-lo nas relações interpessoais, seja com clientes, fornecedores ou internamente, nas equipes.
No Brasil, temos o hábito de se esquivar de um conflito. Ao invés de falar um não, preferimos optar pelo “vou pensar”, “Pode ser”, “depois te falo”, “veja bem…”, o que mostra o quanto somos próximos e com receio de sermos tão diretos.
Já em Israel, é justamente o oposto. É o lugar onde as pessoas estão constantemente discutindo intensamente novas ideias, não aceitando de bate pronto a opinião do outro.
Mas veja bem, conflitar não quer dizer agressividade ou brigar, mas sim, entender se os pontos de vista batem, saber opiniões, noções diferentes que possam fazer a diferença. Isso significa maior possibilidade de ideias, testes, ousadia e, consequentemente, inovações.
Esta singularidade toda foi explicada por meio de alguns blocos, dos quais destaco dois:
Sabemos que as grandes inovações vieram da guerra. Por estarem em conflito há muito tempo, o país teve que desenvolver diversas tecnologias para esse fim. Isso também explica a origem de tantas inovações.
em Israel, ser empreendedor é ser herói nacional, por ser um perfil de risco e por já terem muito exemplos positivos de empreendedores que deram certo e que hoje atuam como investidores.
Quando a pessoa começa a empreender, ela é considerada pela sua família como valente e no caminho para um grande sucesso.
Neste ecossistema concentrado, muitos abriram caminho, atingindo patamares de Exit e de abertura de capital com IPOs (oferta pública), virando investidores anjo e reinvestindo em outras startups, o que tem fortalecido muito a comunidade empreendedora.
E por que há tantas startups globais, por que muitas já nascem assim?
Como o mercado de Israel é super pequeno, se você não começar de maneira global, já começa perdendo.
Portanto, você precisa sempre pensar grande: como é que eu começo montando uma máquina de vendas para o mundo? Como desenvolvo um produto que atinja um nicho de mercado em diferentes países?
No Brasil, a maioria das startups não pensam assim.
Temos um mercado enorme, ao irmos para o nível global aumentamos a nossa complexidade, mas também podemos expandir o público-alvo e com isso conseguir nichar mais o produto e mesmo assim escalar de forma muito mais rápida.
Aqui temos esses trade-offs da estratégia de crescimento, em Israel e eles não têm opção.
Diante deste quadro, como liderar equipes em cenários tão diferentes?
Como resolver conflitos comuns entre o time de produto e vendas, montar uma equipe de alta performance? Como vender para enterprise sem poder ir a campo em uma zona de guerra?
As startups que conheci lá eram bem diferentes. Mas e os problemas? Os mesmos! Argentina, Estados Unidos, Polônia, UK, Espanha, Coreia do Sul...não importa o lugar, sempre haverão dilemas iguais, mesmo que em proporções diferentes.
Um dos aspectos que mais pude colaborar foi em relação a gestão de times. Sempre que possível compartilhava minha visão e desafios sobre recrutamento e seleção à gestão de performance.
E conversando uma uma CEO da Coreia do Sul, vi que realmente podemos aprender muito com ambientes diferentes.
Na Coreia do Sul, por lei, se o recrutador errar, não pode demitir o contratado, é preciso avisá-lo 6 meses antes sobre a situação e realocá-lo no mercado de trabalho para conseguir desligá-lo.
Com isso, as empresas de realocação são super fortes no país por conta da demanda e forçam o recrutador a realmente não errar!
Então de uma conversa despretensiosa aprendi muito sobre as técnicas deles para evitar errar na seleção de novos funcionários.
Muitas outras respostas e aprendizados encontramos em outro lugar, muito especial para mim. E você vai saber o porquê.
Saindo de Tel Aviv, nos dirigimos a Ramala, sede da Autoridade Nacional da Palestina, no centro da Cisjordânia, aproximadamente 15km de Jerusalém.
Eis uma realidade muito diferente da nossa. Famílias que foram perdidas em tantos tempos de guerra, separadas, mutiladas. Uma sensação de medo que perdura até hoje, inclusive quando estávamos a caminho de lá.
Na semana da nossa visita, alguns atentados aconteceram na região. Esquema de segurança forte e clima tenso para nós, founders, e nossos guias do Google.
Cancelar ou não a viagem?
Fomos mesmo assim, com escolta e com o máximo de proteção fornecidos pela organização do Google.
Percorremos as áreas palestinas, cheias de muros, num cenário que parecia fechado, inquietante. Ninguém entrava, ninguém saía.
A qualquer movimentação, um forte esquema de segurança com revistas em check points e raio-x. E isso porque, entre Tel Aviv e Ramala, são 40 minutos de distância.
Mundos tão opostos...Enquanto andávamos tranquilamente no começo da viagem, agora éramos cercados, sempre alertas para que nada inesperado acontecesse.
Nosso destino: Uma aceleradora, chamada Flow, bem no meio do WestBank, área ao norte da Palestina invadida e com conflitos rotineiros.
A tensão antes de entrar lá chegava ao ponto de sermos instruídos a tomar cuidado, como não tirar fotos e ter atenção na hora do que falar às pessoas.
Não tínhamos a menor ideia do que esperar.
E, para nossa surpresa, a recepção foi super calorosa e a cordialidade incrível! Todos os empreendedores palestinos que conheci sonhando grande e remando contra a maré para fazer acontecer, assim como qualquer um de nós.
O Google acabou oferecendo um único treinamento naquela aceleradora, onde ninguém de fora tinha sido recebido antes.
E fiquei surpresa que dentre possíveis conteúdos para uma palestra como growth, modelo de negócio ou investimento, eles escolheram falar sobre Produtividade e auto-conhecimento, um dilema de qualquer founder no mundo.
Durante o treinamento eles conduziram uma meditação guiada com mindfulness e quando me vi estava meditando com diversos palestinos e outros founders do mundo, todos buscando uma única coisa: se melhorar.
Além disso, o Google junto com essa aceleradora organizou sessões de mentorias dadas por nós, founders do Google Alumni Summit, para as startups dessa aceleradora.
Fomos divididos em grupos diversos, como modelos de negócio e investimentos.
Minha mentoria foi sobre gestão de times a todas as startups que haviam lá. E, como disse, mesmo com os desafios sendo parecidos, cada cultura tem suas questões.
É o caso de uma startup de e-commerce B2B, que relatou que um dos seus desafios era como realizar uma venda consultiva para contas enterprise de forma 100% inside sale, porque não podiam colocar os vendedores na rua por conta dos conflitos intenso naquela região.
Outro ponto que algumas startups relataram na minha mentoria foi sobre a dificuldade de recrutar os melhores talentos:
“Se aqui no Brasil disputamos os melhores com outras empresas, lá a rivalidade é com a própria milícia.”
O quão louco é isso? Me faz questionar muito do que dispomos e quantas oportunidades temos. O quanto tudo parece no mínimo mais simples perto desse cenário.
Neste mesmo dia, ainda aconteceu o ápice de toda a minha viagem. Conheci uma menina muito especial.
Durante as minhas conversas com as startups, uma tímida jovem que assistia minha mentoria perguntou:
- Ela: Tenho uma dúvida, criei algo e queria saber como faço para vender
- Eu: Você é de qual startup? Naquele momento pensei que ela fosse estagiária de tão jovem que aparentava. - Ela: Nenhuma. Quero vender algo que eu mesma criei.
Essa jovem palestina tem 16 anos, um inglês perfeito (aprendido pelo amor à língua via séries e livros por vontade própria) e muita determinação.
Me levou até uma sala e me mostrou uma caixa preta comprida e quando abriu tinha uma bengala feita à mão cheia de fios e sensores, que tremia se estivesse a alguns metros de algum objeto físico ou empecilho, tudo ainda ligado a um Bluetooth que passava orientações de locomoção.
De forma meiga ela começou a me explicar que tinha uma professora deficiente visual em sua escola e que, um dia, esta caiu no corredor. Sentida por aquela situação ela resolveu criar a bengala tech para ajudá-la.
“Para quem vendo e o que eu faço?”, me perguntou, perdida. Não era da aceleradora, mas ficou sabendo que um pessoal de fora iria visitar o lugar e quis procurar auxílio.
Não acreditei no que via. Esta pequena prodígio, do alto de seus 16 anos, estava bem ali na minha frente e nitidamente tinha um potencial muito fora da curva que poderia ser perdido.
Naquela hora, não pensei duas vezes: ela precisava ser assessorada!
Rapidamente recorri aos meus colegas do Google e outros founders e logo a sala estava lotada, com muita gente também impressionada e emocionada pela engenhosidade apresentada ali.
Hoje, essa menina está tendo o apoio de um time de Googlers para desenvolver seu potencial.
Estamos todos na torcida para que dê certo, visto que pessoas de Ramala são restritas a sair da região pelas autoridades e essa menina sonha muito grande e tem potencial para impactar o mundo um dia.
Mas veja como o mundo está lotado de talentos!
Saí de lá novamente muito pensativa sobre como temos um monte de dificuldades, mas também muitas oportunidades. E as reclamações que temos no dia a dia ficam pequenas diante disso.
Com o fim do programa do Google Summit, parti com outros dois founders em direção a Belém e Jerusalém, uma região rica em História e berço de 3 religiões: judaísmo, islamismo e cristianismo.
Realmente esta região é muito especial e mesmo eu não sendo muito religiosa pude sentir uma alta energia ali, no mínimo. Passamos pelo muro das Lamentações e, de longe, o monte do Moriá, templo com o belíssimo Domo da Rocha.
Esse é um local sagrado para judeus e muçulmanos, a quem pertence atualmente. Uma das entradas ao Domo é possível por uma ruazinha com diversos guardas e somente os muçulmanos podem acessar o seu interior.
Nem mesmo os turistas podem passar, com exceção aos domingos por uma outra entrada. Então fiquei ali observando como eles acabam identificando quem tem acesso.
Como distinguem um judeu de um muçulmano? É preciso recitar um trecho do Alcorão, o livro sagrado do Islã. Um respeito muito grande.
Esse é um exemplo das muitas sensações e aprendizados das 48 horas enriquecedoras com realidades distintas que tive a oportunidade de vivenciar.
E no final, posso dizer que voltei renovada para este próximo ano depois de tudo que vi.
7 principais aprendizados:
Problemas todos nós empreendedores temos, mas não estamos sozinhos, os desafios são muito semelhantes e podemos aprender muito ao compartilhar com nossos vizinhos no mundo.
Empatia para entender o contexto do outro e poder ajudar livre de pré julgamentos.
Todos nós tendemos a atuar como vilões, heróis ou vítimas em diversas situações. Como fazer diferente? Estando realmente presente de corpo, alma e mente.
Podemos aumentar muito nossa produtividade e resultados conseguindo isso que parece simples, mas é um dos maiores desafios de qualquer pessoa nesse mundo tão conectado, estar presente.
Talentos espetaculares e especiais estão espalhados por todos os lugares, mesmo que inusitados, olhos abertos para identificá-los.
Evoluir rápido e constantemente faz parte de qualquer pessoa que trabalha em uma startup.
Tudo pode ficar mais fácil se estivermos em um ambiente de confiança, termos um profundo autoconhecimento e nos organizarmos para sermos mais produtivos com corpo e mente saudáveis.
Não evitar o conflito. Criar um ambiente que estimule discussões produtivas com pontos de vistas diferentes para evoluirmos e inovarmos cada vez mais.
Gratidão e give back. Fui um dos 12 CEOs selecionados no mundo pelo Google para este Programa e eles investiram muito em mim para que eu pudesse vivenciar tudo isso.
Paralelo, 2018 foi o melhor ano da história da Gupy, batemos todos os recordes e multiplicamos mais de 5 vezes o nosso negócio.
Tudo isso me faz ser muito grata a todas as oportunidades que tenho vivido, a todos pessoas que têm me ajudado e o quanto também preciso continuar retribuindo em mentorias e ajudas que sei que posso contribuir para ajudar outros empreendedores.
São valores que faço questão de trazer para a Gupy. Para a vida. Para você. Porque juntos somos mais fortes. E porque podemos fazer muito mais e melhor no próximo ano.